sexta-feira, 11 de agosto de 2017

BI - Caderno de Identidade





  video de Margarida Cardoso Martins.


Apresentação do meu texto «O Luís Miguel quer ir para o Panteão Nacional», incluído no livro BI - caderno de Identidade. 


Meus senhores, boa tarde.
Agradeço a todos a amabilidade de virem ao nosso encontro e partilhar este final de dia de forma diferente, e sobretudo agradeço aos nossos convidados: Rui Cardoso Martins, Manuel Halpern e Firmino Bernardo, por terem tido a paciência de ler os nossos textos e dizer de vossa justiça. Serei breve na minha intervenção.

Três textos e um prefácio, quatro autores, quatro moradores do mesmo livro. Escritas diferentes, identidades diferentes, propriedade intelectual diferente, número de página diferente. Estou muito bem acompanhada pelos meus vizinhos escritores e beneficio dessa proximidade. Eu e o catalão Iñigo Maçainhas Fuent Volt, que se passeia nos três textos.

Neste livro, habito o lugar do meio, entre o «provar quem sou» e «eu, por ti, me identifico». Moro nas palavras-furtadas deste prédio. Palavras furtadas pelo simples acto de ler. Sou uma leitora que se apropria das palavras e das ideias dos livros que lê. Não sou uma escritora.

Furtar palavras não é fácil. Não há uma fórmula. Mas foi assim, num acto de rebeldia, sem pedir licença, que os filósofos Hannah Arendt, António Marques e Eduardo Lourenço, o historiador Tony Judt, o sociólogo Manuel Castells, o cineasta Jean Luc-Godard, os escritores Mário de Carvalho, Rui Cardoso Martins, Eça de Queiroz, Gonçalo M Tavares (que me trouxe Eurípedes), Italo Calvino, Lewis Carroll, Miguel Cervantes, José Saramago, Luís de Camões e Fernando Pessoa entraram no meu conto.

Um conto ensaiado ou um ensaio contado ou nem uma coisa nem outra. Um texto pouco obediente às regras da literatura, certamente desobediente às regras da academia científica. A história decorre no Mercado Municipal, mas existe uma tese por detrás da história: a importância da identidade na cidadania.

Quase todas as personagens são fictícias mas beberam do espírito possante das gentes e dos mercados reais, lugares que nos obrigam a estar bem atentos. Vivemos ali a experiência dos cinco sentidos. Ou melhor, dos seis.

A personagem principal é Adelaide, filha de Manuel Espada e neta de João Mau-Tempo, todos personagens fictícias de Levantado do Chão, livro de José Saramago. O tempo passou por Adelaide. Tem agora 62 anos.

O homem-manifestação que aparece na Véspera de Domingo, é real. Veio directamente de Lisboa, da Manifestação de 15 de Setembro de 2012, em busca de ouvintes nas páginas deste conto. O discurso que pronuncia é da sua autoria. Eu limitei-me a ser a sua caneta. Terá agora, sem o saber, alguns leitores. A democracia aprende-se muito devagar, portanto, o que o homem-manifestação disse antes é válido hoje: não deve haver vazios em democracia, não deve mentira em democracia.

Luís Miguel, que dá título ao conto ensaiado, é inspirado em Luís Manuel, personagem real, assíduo do Mercado Municipal da cidade onde vivo. Tanto um como outro manifestam alguma dificuldade na aprendizagem, têm internet, sabem usar o multibanco e fazem contas de cabeça. Estão ambos fora da atitude consumista e da normalização do comportamento, próprios do fenómeno social, mas também não conseguem assumir responsabilidade com a durabilidade do mundo e com a liberdade, próprias do agir político. Luís Manuel também emprestou a Luís Miguel a sua curiosa metafísica, ou seja, a vontade de ir para o Panteão Nacional. A propriedade e a impropriedade de Luís Manuel chamaram-me a atenção. É uma pessoa diferente, mas perfeitamente integrada num lugar que foi sempre capaz de aceitar a diferença. Um lugar distinto, plural. Talvez possamos aprender um pouco com este modo simples mas intenso de viver a proximidade.  

A ideia de escrever sobre a Identidade nasceu precisamente da proximidade. Num dia igual a tantos outros, quando, descontraídos, nós três celebrávamos a amizade com filetes de peixe-galo, feijoada à transmontana, um copo de vinho, sobremesa caseira e uma boa gargalhada. Rui Cardoso Martins brindou-nos com um prefácio à Rui Cardoso Martins. Não há outro igual. Muito obrigada. A editora By The Book deu corpo à nossa ideia. Editou este livro que vos convido a ler, em silêncio e com tempo, quanto mais não seja, para contrariar a insustentável leveza das moscas, dos políticos-mosca e das cidades-mosca, que transformam a nossa vida em facto alternativo. OBG

Abril/2017

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