O exemplo deve vir de cima, mas ninguém nos avisou que seria das moscas.
É certo que as moscas, bichos de notável adaptabilidade, dominam o nosso espaço aéreo mais privado, conspurcam o nosso alimento, desafiam a nossa luz, desfocam-nos o alvo, reproduzem-se sem licença, fazem-nos cócegas e no fim, apenas no fim, atrevem-se a amolecer à nossa frente. Descaradas! É mais que certo que tratam da sua vidinha não olhando ao resto (e que olhos elas têm!). Iguais entre si, iguaizinhas, voltam sempre que o tempo aquece. Ano após ano, sempre as mesmas moscas. Pelo menos, assim parece.
E se parece, é! (pois é de política que falamos).
As moscas carregam os bacilos da ignorância nas patas, no corpo, nas asas e na tromba mole. Proboscis ameaçador, se visto à lupa. Mas falta-nos essa lente. Bichinhos inocentes, pensamos. Enganamo-nos. As moscas não dormem. Enviam emails pela madrugada adentro, trabalham em surdina. Metem-se em aviões e fazem negócios da china. Urdem planos, conspiram, usurpam, vigiam-se, atraiçoam-se. Comprometem o futuro. Pudera! O seu ciclo de vida é estupidamente curto! A única preocupação centra-se no seu próprio umbigo.
Moscas com umbigo, coisa bizarra.
E a bizarria, sabemos nós, é própria dos humanos. A despropósito, como irá o Acordo Ortográfico, nesta ideia de juntar línguas, resolver significados diferentes para a mesma palavra? Bizarro: bem-apessoado, alto e belo, ou Bizarro: extravagante, excêntrico e esquisito? Neste caso, aplicam-se ambos. Mais uma prova de que os políticos-mosca estão em concordância com os tempos modernos.
Os entendidos chamam-lhe co-evolução.
Também poderíamos chamar-lhe Revolução, Devolução, Evolução, Involução ou Denegação. Mas a questão não interessa às moscas, o seu cérebro está mais ocupado com a fuga rápida a qualquer ameaça.
Não há cidades para as moscas porque são incapazes de sair da ordem doméstica, falta-lhes mundo. Prisioneiras da necessidade e da urgência, mostram-se inábeis para a organização política. E o que parece, é!
Imperfeita cidadania? Próprio das moscas.
O povo que se cuide.
FC/04março2015
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