quinta-feira, 2 de julho de 2015

Profundamente actual


“… there is apparently in the human mind itself one element capable of compelling the other and thus creating power ” - palavras de Arendt na voz de Godard (1997).


É possível descobrir um mundo comum entre Arendt e Jean-Luc Godard. Quero aproveitar esta oportunidade para relembrar o filme Notre Musique (Godard, 2004), a partir do qual é possível estabelecer um diálogo entre os juízos estéticos de Godard e a racionalidade de Arendt. O filme traz-nos uma pluralidade de personagens, de idiomas e de discursos, num cenário de reconstrução de uma ponte que pretende anular a ruptura entre o passado e o futuro, e confirma a actualidade do pensamento de Arendt. O cineasta apresenta-nos uma cidade em reconstrução, um cenário do pós-guerra a partir da qual se espreita o caos do mundo, convocando o conflito israelo-palestino e o racismo como fenómeno de exclusão, e contrapõe uma nova ordem por via do perdão, não tanto no plano moral mas sim, e principalmente, no plano político. Godard inclui no filme uma aula sobre a racionalidade instrumental contida na arte cinematográfica, através da qual nos revela a forma como ele próprio interpretou os fenómenos do mundo. Um filme que não procura a verdade absoluta, antes pelo contrário, induz o espectador a formular os seus próprios juízos a partir das verdades factuais, que vão surgindo no ecrã, e da habilidade persuasiva do cineasta, patente na globalidade do filme. Profundamente actual.



FC16Out2014


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